“Oh noite ditosa, em que o
céu se une à terra, em que o homem se encontra com Deus!” (Proclamação
da Páscoa).
Estamos na festa da Páscoa, que é a festa cristã por
excelência. Escutamos no evangelho: “Antes da festa da Páscoa, sabendo Jesus
que chegara sua hora de passar deste mundo para o Pai, tendo amado os seus que
estavam no mundo, amou-os até o fim” (Jo 13,1).
A Páscoa de Jesus deu-se dentro da Páscoa judaica: foi nesse
contexto que ele instituiu e celebrou a sua. Na Páscoa de Jesus a Páscoa
judaica é cumprida, isto é, encontra sua realização plena: a libertação
definitiva não foi aquela, dos que saíram do Egito, atravessaram o mar e
entraram na Terra Prometida, mas sim a de Jesus, que saiu deste mundo,
atravessou o mar tenebroso da morte e entrou na plenitude do Pai.
A palavra “páscoa” é explicada como significando “passagem”:
"passagem" porque Deus feriu os primogênitos dos egípcios, mas
“passou” adiante na casa dos hebreus, poupando seus primogênitos: Deus passou
pelo Egito e “pulou” as casas do povo de Israel (cf. Ex 11,1-10);
"passagem" também porque Israel passou pelo mar, saindo do estado de
escravidão para a liberdade, como povo: o Senhor Deus "passou" pelo
Egito para fazer seu povo "passar"! Quando Deus "passou"
pelo seu povo, o povo de Deus "passou" para uma nova vida, para a
liberdade rumo à Terra Prometida. Nosso Deus é assim: passando, faz passar! É
isso que os judeus celebram na Páscoa atualizando esse acontecimento. Jesus
celebra agora a sua Páscoa, sua “passagem deste mundo para o Pai”! Ele mesmo
afirmou, certa vez: “Saí do Pai e vim ao mundo; agora deixo o mundo e volto ao
Pai!” (Jo 16,28).
A Páscoa de Jesus é um ato de amor total e extremo por
nós... é para nossa salvação que Jesus fez sua Páscoa. Fez sua
"Passagem" para que também nós façamos a nossa: “Tendo amado os seus
que estavam no mundo, amou-os até o fim”, até o extremo. É verdade que traíram
Jesus, humilharam-no, tiraram-lhe a vida... Mas, por outro lado, ele se entregou
livremente, em obediência ao desígnio do Pai: "Eu dou minha vida para
retomá-la. Ninguém a tira de mim, mas eu a dou livremente. Tenho poder de
entregá-la e poder de retomá-la; este é o mandamento que recebi do meu
Pai" (Jo 10,17s). E isto, por amor a nós, pois morrendo e ressuscitando,
ele nos daria o seu Espírito Santo, no qual ele mesmo fora ressuscitado, de
modo que a "passagem" de Jesus para o Pai nos abrisse o caminho e
pudéssemos "passar" também para o Pai: “Vou preparar-vos um lugar, e
quando eu me for e vos tiver preparado um lugar, virei novamente e vos levarei
comigo, a fim de que onde eu estiver, estejais vós também. Eu sou o Caminho!”
(Jo 14,2.6).
Esta Páscoa sagrada do Senhor e nossa, a Igreja celebra a
cada Domingo e até a cada dia na Eucaristia e, de modo soleníssimo, uma vez ao
ano, com o Tríduo Pascal e os subsequentes cinquenta dias, concluindo com a
solenidade de Pentecostes, celebração do dom do Espírito que o Ressuscitado fez
e faz à sua Igreja. Na potência do Espírito, no qual ele mesmo foi ressuscitado
pelo Pai, Jesus está e estará sempre conosco, de modo real e concreto, guiando
a preservando a sua Igreja, até a consumação dos séculos.
Um Dia, que já não mais será um dos dias deste nosso tempo,
o Senhor morto e ressuscitado, "Cordeiro de pé, como que imolado" (Ap
5,6), se manifestará na glória do seu Espírito Santo – o mesmo que já habita em
nós desde o batismo – e levará todas as coisas à plenitude. Então, tendo
transfigurado tudo no seu Espírito, Cristo entregará tudo ao Pai e o Reino de
Deus será plenamente consumado... e nós, plenificados, estaremos eternamente
com o Senhor, num mundo liberto e renovado... e Deus, o Pai, será tudo em
todos, pelo Filho, na glória do Espírito (cf. 1Cor 15,20-28).
Bento XVI, na Vigília Pascal de 2012: “O Precônio, o grande
hino que o diácono canta ao início da Liturgia Pascal, de modo muito discreto
chama a nossa atenção ainda para outro aspecto. Lembra-nos que o material do
círio se fica a dever, em primeiro lugar, ao trabalho das abelhas; e, assim,
entra em cena a criação inteira. No círio, a criação torna-se portadora de luz.
Mas, segundo o pensamento dos Padres, temos aí também uma alusão implícita à
Igreja. Nesta, a cooperação da comunidade viva dos fiéis é parecida com o
trabalho das abelhas; constrói a comunidade da luz. Assim podemos ver, no
círio, também um apelo dirigido a nós mesmos e à nossa comunhão com a
comunidade da Igreja, que existe para que a luz de Cristo possa iluminar o
mundo. Neste momento, peçamos ao Senhor que nos faça sentir a alegria da sua
luz, de modo que nós mesmos nos tornemos portadores da sua luz, para que,
através da Igreja, o esplendor do rosto de Cristo entre no mundo (cf. LG 1).
Neste momento da história, em que temos tantos desafios e
interpelações, a Igreja se coloca em perspectiva de conversão pessoal e
comunitária. Das raízes mais profundas de nossa comunhão com Deus, vivenciada
através dos exercícios quaresmais, deve brotar o ímpeto renovador que impregne
nossa vida e oriente para a missão.
Ao mesmo tempo em que reflete sobre si mesma, a Igreja vibra
da alegria no anúncio do Evangelho. Não pode deixar de exultar no Espírito
Santo, juntamente com seu Senhor, por ver e ouvir as maravilhas pelas quais
esperaram os profetas e que foram a nós concedidas (cf. Lc. 10,21-24). E agora
esta alegria se expande no louvor ao Ressuscitado.
Eis a nossa fé, nossa certeza, nossa esperança, nosso
sonho... já começado no Dia da Páscoa! A Ressurreição não é uma ilusão, não é
uma quimera; é uma estupenda Realidade: "Eu sou a Ressurreição! Quem crê
em mim, ainda que morra, viverá!" (Jo 11,25).
Portanto, a celebração da Páscoa deve renovar nossa
esperança no mundo de paz, sem guerras, sem violência e sem ódio. Disse Jesus
“Felizes os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus” (Mt 5,9).
Partilhando as alegrias da Páscoa de Nosso Senhor desejo a
todos uma Feliz Páscoa. O Senhor ressuscitou de verdade! Aleluia!
Texto: Cardeal Orani João
Tempesta - Arcebispo do Rio de Janeiro
(RJ)
Fonte: CNBB
Foto retirada da internet
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