domingo, 20 de março de 2016

Liturgia Diária 24/03/2016 CEIA DO SENHOR

Primeira Leitura: Êxodo 12,1-8.11-14
Naqueles dias: O Senhor disse a Moisés e a Aarão no Egito: “Este mês será para vós o começo dos meses; será o primeiro mês do ano. Falai a toda a comunidade dos filhos de Israel, dizendo: ‘No décimo dia deste mês, cada um tome um cordeiro por família, um cordeiro para cada casa. Se a família não for bastante numerosa para comer um cordeiro, convidará também o vizinho mais próximo, de acordo com o número de pessoas. Deveis calcular o número de comensais, conforme o tamanho do cordeiro. O cordeiro será sem defeito, macho, de um ano. Podereis escolher tanto um cordeiro, como um cabrito: e devereis guardá-lo preso até ao dia catorze deste mês. Então toda a comunidade de Israel reunida o imolará ao cair da tarde. Tomareis um pouco do seu sangue e untareis os marcos e a travessa da porta, nas casas em que o comerem. Comereis a carne nessa mesma noite, assada ao fogo, com pães ázimos e ervas amargas. Assim devereis comê-lo: com os rins cingidos, sandálias nos pés e cajado na mão. E comereis às pressas, pois é a Páscoa, isto é, a ‘Passagem’ do Senhor! 

E naquela noite passarei pela terra do Egito e ferirei na terra do Egito todos os primogênitos, desde os homens até os animais; e infligirei castigos contra todos os deuses do Egito, eu, o Senhor. O sangue servirá de sinal nas casas onde estiverdes. Ao ver o sangue, passarei adiante, e não vos atingirá a praga exterminadora, quando eu ferir a terra do Egito. Este dia será para vós uma festa memorável em honra do Senhor, que haveis de celebrar por todas as gerações, como instituição perpétua. - Palavra do Senhor.

Comentário: O relato da celebração da Páscoa israelita está inserido no contexto do movimento de libertação da escravidão no Egito. É a atualização de um ritual antigo, realizado entre os pastores, para reconciliar-se com a divindade, afastar os maus espíritos e, assim, assegurar o bem-estar das famílias com seus rebanhos. A experiência da libertação dos escravos no Egito torna-se a marca registrada de sua própria identidade. O povo de Israel nasceu com o êxodo. Diversos grupos de diferentes origens unem-se ao redor de um projeto de liberdade e autonomia. Pouco a pouco, vai se firmando a consciência de pertença ao “povo de Deus”. De fato, somente sob a intervenção divina foi possível a caminhada de libertação. Essa certeza atravessa as gerações, conforme constatamos nos diversos escritos do Primeiro Testamento. A celebração da Páscoa foi sendo adotada por Israel como memória exemplar do acontecimento fundante do êxodo. Ela atualiza a presença de Deus na história do povo. É uma presença atenta e atuante na defesa da vida das pessoas oprimidas. Celebrar a memória do êxodo, portanto, significa reavivar a consciência de ser um povo abençoado. Significa reanimar o povo para a fidelidade à aliança com Deus, que é companheiro na caminhada. É comprometer-se, no presente, com o processo de libertação. A Páscoa, portanto, é memória subversiva. Unindo elementos antigos e novos, a narrativa da Páscoa enfatiza a necessidade da celebração por ordem divina, num dia preciso, no “primeiro mês do ano”. Corresponde ao início da primavera, tempo em que desabrocha a vida nova. O cordeiro é essencial nessa celebração: é a oferta de cada família e de toda a comunidade, em reconhecimento à bondade divina. Para isso, é escolhido e preparado um cordeiro, sem defeito, para imolá-lo. A integridade física do animal é o que de melhor o povo pode ofertar a Deus como sinal de gratidão por tudo o que ele oferece. O sangue para marcar a porta da casa tem o sentido de garantia de vida para as pessoas que nela habitam. É um povo eleito sob a proteção de Deus. Não será atingido pela última praga, ou seja, a morte dos primogênitos (a narrativa da Páscoa está situada entre a penúltima e a última praga). Assim, o povo terá um futuro garantido sob as bênçãos divinas. A refeição é feita num clima de urgência – rins cingidos, sandálias nos pés e cajado na mão –, atualizando assim a movimentação do povo escravizado em vista de sua libertação. Com ervas amargas, para lembrar a vida difícil do povo enquanto escravo no Egito; com pães ázimos, pois a pressa não permite que o fermento possa levedar a massa. O pão puro é símbolo de fidelidade ao projeto de libertação, que inclui a caminhada pelo deserto, animados pelo sonho da terra prometida. Como se vê, o ritual da Páscoa é memória ligada ao compromisso de caminhar na conquista de um mundo de liberdade, paz e dignidade. (Vida Pastoral)

Salmo: 115(116B),12-13.15-16bc.17-18 O cálice por nós abençoado é a nossa comunhão com o sangue do Senhor.
Que poderei retribuir ao Senhor Deus por tudo aquilo que ele fez em meu favor? Elevo o cálice da minha salvação, invocando o nome santo do Senhor.

É sentida por demais pelo Senhor a morte de seus santos, seus amigos. Eis que sou o vosso servo, ó Senhor, mas me quebrastes os grilhões da escravidão!

Por isso oferto um sacrifício de louvor, invocando o nome santo do Senhor. Vou cumprir minhas promessas ao Senhor na presença de seu povo reunido.

Segunda Leitura: 1ª Coríntios 11,23-26
Irmãos: O que eu recebi do Senhor foi isso que eu vos transmiti: Na noite em que foi entregue, o Senhor Jesus tomou o pão e, depois de dar graças, partiu-o e disse: “Isto é o meu corpo que é dado por vós. Fazei isto em minha memória”. Do mesmo modo, depois da ceia, tomou também o cálice e disse: “Este cálice é a nova aliança, em meu sangue. Todas as vezes que dele beberdes, fazei isto em minha memória”. Todas às vezes, de fato, que comerdes deste pão e beberdes deste cálice, estareis proclamando a morte do Senhor, até que ele venha. - Palavra do Senhor.

Comentário: O texto da liturgia de hoje corresponde ao relato mais antigo da última ceia de Jesus. São Paulo revela ser a transmissão do que ele mesmo recebeu do Senhor: trata-se da tradição dos apóstolos, que, por serem eles testemunhas oculares de Jesus histórico, é respeitada com veneração. A ceia, celebrada pelas comunidades cristãs primitivas não seguiam fórmulas fixas e uniformes. De modo comum, era realizada em forma de refeição, ocasião em que se fazia – comemorando a sua entrega – a memória de Jesus, cujo corpo é representado pelo pão e pelo vinho. É celebração da nova aliança, inaugurada por Jesus e da qual os cristãos se tornam participantes. No texto da liturgia de hoje, percebemos os elementos essenciais da eucaristia. Jesus a instituiu como memória de sua morte. É sacrifício (= ação sagrada), dom total de Jesus, em consciência e liberdade, pela vida do mundo. É sustento para os que dela participam, comprometidos na vivência do amor, até que Jesus venha. É bom não esquecer o contexto imediato em que o texto está inserido (11,17-24). Paulo pronuncia-se em forma de reprimenda. A Igreja de Corinto reunia-se no propósito de participar da ceia sem o principal requisito para a celebração: a solidariedade com os pobres. A divisão existente na comunidade revelava uma conduta egoísta e discriminatória. A participação do mesmo pão e do mesmo cálice é comunhão com o Corpo do Senhor, a qual não pode estar dissociada da comunhão com os irmãos, ainda mais com o agravante de serem pessoas necessitadas. (Vida Pastoral)

Evangelho de Jesus Cristo segundo João 13,1-15
Era antes da festa da Páscoa. Jesus sabia que tinha chegado a sua hora de passar deste mundo para o Pai; tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim.

Estavam tomando a ceia. O diabo já tinha posto no coração de Judas, filho de Simão Iscariotes, o propósito de entregar Jesus. Jesus, sabendo que o Pai tinha colocado tudo em suas mãos e que de Deus tinha saído e para Deus voltava, levantou-se da mesa, tirou o manto, pegou uma toalha e amarrou-a na cintura. Derramou água numa bacia e começou a lavar os pés dos discípulos, enxugando-os com a toalha com que estava cingido. Chegou a vez de Simão Pedro. Pedro disse“Senhor, tu me lavas os pés?” Respondeu Jesus“Agora, não entendes o que estou fazendo; mais tarde compreenderás”. Disse-lhe Pedro“Tu nunca me lavarás os pés!” Mas Jesus respondeu“Se eu não te lavar, não terás parte comigo”. Simão Pedro disse: “Senhor, então lava não somente os meus pés, mas também as mãos e a cabeça”. Jesus respondeu: “Quem já se banhou não precisa lavar senão os pés, porque já está todo limpo. Também vós estais limpos, mas não todos”. Jesus sabia quem o ia entregar; por isso disse: “Nem todos estais limpos”.

Depois de ter lavado os pés dos discípulos, Jesus vestiu o manto e sentou-se de novo. E disse aos discípulos: “Compreendeis o que acabo de fazer? Vós me chamais Mestre e Senhor, e dizeis bem, pois eu o sou. Portanto, se eu, o Senhor e Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros. Dei-vos o exemplo, para que façais a mesma coisa que eu fiz. - Palavra da Salvação.

Comentários:

O grupo de discípulos de Jesus teve muitas oportunidades de ser instruído por ele, em suas contínuas peregrinações. Cada um, porém, trazia consigo seus esquemas culturais e religiosos, nem sempre fáceis de serem questionados e de passarem por um processo de conversão. Um destes esquemas dizia respeito à desigualdade fundamental entre as pessoas e à consequente relação de superioridade de umas sobre as outras. A proposta de Reino, proclamada por Jesus, partia da igualdade fundamental entre todos os seres humanos. Portanto, a mentalidade reinante chocava-se frontalmente com o seu projeto. E Jesus não hesitou em tocar neste tabu. A forma escolhida foi a de pôr-se a lavar os pés dos discípulos, por ocasião da última ceia. A reação impertinente de Pedro revelou seu horizonte cultural. Jesus o questionou: se ele não estivesse disposto a deixá-lo lavar-lhe os pés, não teria a menor condição de continuar a ser seu discípulo. Se Pedro impedisse o Mestre de assumir a postura serviçal de um escravo, invertendo os papéis, futuramente haveria de se perpetuar, na comunidade cristã, a estrutura social denunciada pela pregação de Jesus. O Reino, neste caso, ficaria privado de sua originalidade e o projeto de Deus dificilmente se implantaria na história humana. A lição do Mestre era cristalina: sua dignidade não ficou diminuída por ter-se curvado diante dos discípulos.  (Padre Jaldemir Vitório/Jesuíta)

Fonte: CNBB - Missal Cotidiano (Paulus)
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