Que a nossa inteligência, iluminada pelo Espírito da
Verdade, acolha com o coração puro e liberto, a glória da cruz que se irradia
pelo céu e a terra; e perscrute, com o olhar interior, o sentido destas
palavras do Senhor, ao falar da iminência de sua paixão:
Chegou a hora em que o Filho do Homem vai ser glorificado (Jo 12,23).
E em seguida: Agora sinto-me angustiado. E que direi? “Pai, livra-me desta
hora!”? Mas foi precisamente para esta hora que eu vim. Pai, glorifica o teu
Filho! (Jo 12,27). E tendo vindo do céu a voz do Pai que dizia: Eu o
glorifiquei e o glorificarei de novo! (Jo 12,28), Jesus continuou, dirigindo-se
aos presentes: Esta voz que ouvistes não foi por causa de mim, mas por causa de
vós. É agora o julgamento deste mundo. Agora o chefe deste mundo vai ser
expulso, e eu, quando for elevado da terra, atrairei tudo a mim (Jo 12,30-32).
Ó admirável poder da cruz! Ó inefável glória da Paixão! Nela
se encontra o tribunal do Senhor, o julgamento do mundo, o poder do
Crucificado!
Atraístes tudo a vós, Senhor, para que o culto divino fosse
celebrado, não mais em sombra e figura, mas num sacramento perfeito e solene,
não mais no templo da Judéia, mas em toda parte e por todos os povos da terra.
Agora, com efeito, é mais ilustre a ordem dos levitas, maior
a dignidade dos sacerdotes e mais santa a unção dos pontífices.
Porque vossa cruz é fonte de todas as bênçãos e origem de todas
as graças. Por ela, os que creem recebem na sua fraqueza a força, na
humilhação, a glória, na morte, a vida.
Agora, abolida a multiplicidade dos sacrifícios antigos,
toda a variedade das vítimas carnais é consumada na oferenda única do vosso
corpo e do vosso sangue, porque sois o verdadeiro Cordeiro de Deus que tirais o
pecado do mundo (Jo 1,29). E assim realizais em vós todos os mistérios, para
que todos os povos formem um só reino, assim como todas as vítimas são
substituídas por um só sacrifício.
Proclamemos, portanto, amados filhos, o que o santo doutor
das nações, o apóstolo Paulo, proclamou solenemente: Segura e digna de ser
acolhida por todos é esta palavra: Cristo veio ao mundo para salvar os
pecadores (1Tm1,15).
E é ainda mais admirável a misericórdia de Deus para conosco
porque Cristo não morreu pelos justos, nem pelos santos, mas pelos pecadores e
pelos ímpios. E como a natureza divina não estava sujeita ao suplício da morte,
ele assumiu, nascendo de nós, o que poderia oferecer por nós.
Outrora ele ameaçava nossa morte como poder de sua morte,
dizendo pelo profeta Oséias: Ó morte, eu serei a tua morte; inferno, eu serei a
tua ruína (cf. Os 13,14). Na verdade, morrendo, ele se submeteu às leis do
túmulo, mas destruiu-as, ressuscitando. Rompeu a perpetuidade da morte,
transformando-a de eterna em temporal. Pois, como em Adão todos morrem, assim
também em Cristo todos reviverão (1Cor 15,2).
São
Leão Magno (400/461)
Papa e Doutor da
Igreja
Foto retirada da internet
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